terça-feira, 4 de março de 2008

Outro dia

Miguel acordou num sobressalto. A noite fora curta, recortada por sonhos confusos, e o estômago movia-se furiosamente. Estava de ressaca, como sempre acontecia após uma festa como a da noite anterior. Uma noite, aliás, bem pobre. Igual a tantas outras, sem mais nem menos significado. Se conseguisse controlar as suas expectativas e guiar-se pela voz da experiência, teria previsto aquele desfecho. Teria sido mesmo preferível ter ficado em casa com aquele novo jogo que comprara para a Playstation, mas a fantasia tinha levado a melhor. Revendo rapidamente o fracasso da noite anterior, arrumou mentalmente o assunto. Decididamente, empresas de dating não seriam a resposta para os seus problemas. A custo, levantou-se e, cumprindo o seu ritual de todos os dias, dirigiu-se, a espreguiçar, à janela, pretexto que considerava ser suficiente para disfarçar uma olhadela ao apartamento do seu vizinho. Os cortinados estavam fechados. Não havia qualquer movimento. Suspirou aliviado. Era da forma que passaria mais um dia sem juntar outro pormenor suspeito à sua já fantasiosa história e que não se perderia em novas formulações e divagações. Subitamente consciente que não poderia demorar-se muito mais e que o duche frio o esperava, olhou languidamente para a cama ainda morna e pensou duas vezes. Se calhar ninguém daria pela sua falta. Bem, talvez isso não fosse possível, mas qual seria a verdadeira relevância para o mundo do seu esforço? Talvez tirasse o dia de folga e ficasse a recuperar o ânimo entre os seus apetecíveis lençóis de linho e sob o quente edredon.. Bom, pensou, enquanto finalmente se decidiu a abrir as torneiras do duche, o dia promete. Com este estado de espírito, Virginia, minha cara, hoje poderia escrever um dos teus livros.

Alphabet

1 comentário:

Anónimo disse...

Finalmente começo a ler as hitórias que escondes entre sonhos...